A clarineta foi inventada pelo alemão J. Christoph Denner em Nuremberg, por volta de 1690. Possui dois timbres distintos, cada um em seu próprio registro: o registro grave (chalameau) e o registro agudo (clarino) que é obtido por meio de uma chave manejada pelo polegar da mão esquerda.
Dificilmente pode-se atingir as notas mais agudas com uma afinação correta e um som adequado. Outra grande dificuldade nesse instrumento é a transição do registro grave para o agudo, devido a uma articulação incômoda das notas intermediárias entre esses registros.
Desde as pequenas formações de New Orleans, a clarineta ocupava um lugar de destaque, competindo dinamicamente com o trompete. E por aproximadamente dez anos, a partir de 1935, o instrumento se tornou símbolo do jazz no mundo. Graças a solistas como Bechet, Johnny Dods, Jimmy Noone, passando por Bigard e Edmond Hall, a clarineta alcançou um extraordinário impacto e elevado nível técnico que culminou com Benny Goodman. Talvez esse virtuosismo de Goodman e de seus contemporâneos tenha tornado a continuidade na evolução técnica da clarineta um obstáculo quase intransponível, e é bem significativo esse interesse maior do saxofonista de hoje pela flauta, como um instrumento optativo na orquestra de jazz.
Os grandes solistas da clarineta que aqui surgiram foram inspirados pelo músico americano. Na América do Norte o instrumentista tem realmente acesso as gravadoras, e também o interesse público. São fatores importantes para a evolução da música popular. Surge daí uma quantidade imensa de gravações. O músico no Brasil se informa da importância dessas obras através de um justo trabalho e perfeita colaboração das rádios e dos jornais da cidade.
Entre os mais importantes solistas brasileiros colocam-se Luiz Americano, Abel Ferreiro, Zacarias, Severino, K-Ximbinho e Netinho. Sobre Zacarias e K-Ximbinho gostaria de ter uma outra oportunidade para falar deles. Luiz Americano e Abel Ferreiro, que se mantiveram fiéis à tradição do chorinho, foram logo esquecidos. Seus trabalhos merecem ser mais divulgados.
Afigura-se como um dos mais importantes o clarinetista e arranjador Severino Araújo, cuja força criativa provocou uma mudança de concepção orquestral no samba e no chorinho. Influenciado pelo estilo de Artie Shaw demonstrava um ótimo controle da região aguda, excelente técnica e uso apropriado de efeitos labiais.
O baiano Netinho foi o melhor clarinetista pós-Severino, o mesmo acontecendo com Buddy de Franco nos Estados Unidos em relação a Benny Goodman e Artie Shaw. Netinho e De Franco não conquistaram a mesma popularidade de seus antecessores, simplesmente por terem chegado em época errada.
O aparecimento de Charlie Parker com estilo bebop, trouxe um aumento de volume orquestral, que a clarineta não pôde acompanhar, e assim portanto, deixou de desempenhar uma de suas funções mais importantes, que era a de "passear" o fraseado sobre a massa orquestral, função esta que veio a ser realizada pelo trompete.
Enquanto o jazz evoluía, exigindo um aprimoramento técnico cada vez maior do executante, o papel da clarineta se dirigia no sentido inverso. Simultaneamente à perda de importância no jazz, surgiu Jimmy Giuffre que se incumbiu de escurecer aquele som outrora brilhante, usando preferentemente a região grave. E então ela se apagou definitivamente.
Esta realidade não está sendo encarada facilmente pelos clarinetistas mais fanáticos. Muitos clarinetistas-saxofonistas se recusam, usando toda sorte de argumentos, a encarar uma flauta. Amar a um outro instrumento assim de repente paira como uma ameaça. Bem se poderia dizer que tocar vários instrumento seria como admitir-se a poligamia. Porque todo instrumento tem seu encanto próprio e oferece diferentes sons. O músico pode ficar apaixonado por um deles.
Mas não podemos esquecer das exigências profissionais. Assim, se considerarmos as já existentes dificuldades quanto a oportunidades de trabalho do músico instrumentista no Brasil e a ela acrescentarmos os novos eventos ocorridos no panorama da música internacional, podemos facilmente concluir da necessidade de que o músico instrumentista de sopro se dedique ao estudo de outros instrumentos correlatos à clarineta, como clarone, flauta, fagote e oboé, bem como todos os tipos de saxofone.
Assim fazem os músicos de Nova York e Los Angeles. Duvido muito que já não se esteja fazendo isso no Brasil. Copinha e Jorginho, os primeiros saxofonistas-flautistas (ou vice-versa) do Rio já devem estar pensando em aumentar ainda mais suas possibilidades na profissão.
O entusiasmo que reina em nosso País atualmente nos faz acreditar que também a música conquistará uma importância maior, exigindo do profissional uma contribuição mais eficiente.
E é para essa nova fase que deveremos estar preparados.